Apresento-lhes Warley Matias
Meus queridos, apresento-lhes um texto do escritor e professor de Literatura Warley Matias - pessoa com quem tenho o prazer de conviver. Deem uma passada em seu blog (o link se encontra no final do texto), procure saber como adquirir seus livros (são maravilhosos) e, sobretudo, transcendam as linhas e pensem! Um grande abraço.
Mais pensadores e menos jogadores de futebol
Quando um aluno me pergunta, com desprezo, “Por que estudar Literatura?”, como se isso fosse uma perda de tempo, meu desejo real é mandar-lhe para a puta que o pariu e a seus irmãos asnos. Mas contenho meus impulsos e pergunto-lhe:— Pra que pensar, né? Afinal, o pensamento não leva ninguém a lugar nenhum!
Fica no ar alguma coisa incômoda que o pobre demente não consegue alcançar, entremeada em seu sorrisinho imbecilizado.
Quando penso nas “comunidades”, “morros”, “favelas” ou qualquer nome poético criado para caracterizar esses aglomerados de gente, miséria, drama e fúria, lembro-me das ONGs, sempre preocupadas em transformar as vidas dos meninos e meninas aí sobreviventes. As ONGs são de suma importância e devem continuar seu trabalho, mas quantas delas oferecem para esses meninos e meninas espaços para se discutir Filosofia e Literatura? O foco está sempre no trabalho e, principalmente, no esporte; este, acredita-se, é capaz de mudar a vida desses jovens, com disciplina e superação, o que parece não se diferenciar muito do serviço militar. E até mesmo projetos de governos em áreas “de risco” sempre privilegiam o trabalho e o esporte.
Hoje, com a discussão em torno da diminuição da maioridade penal (mais um paliativo enganador de trouxas) e com a preocupante transformação das universidades públicas, que começam a perder seu perfil crítico e são massificadas pelo ENEM, cansei de jogar meu sorrisinho irônico e senti a necessidade de vomitar meus pensamentos.
Não sou um homem de estatísticas, sou um observador. E, apesar de não haver saído a campo para colher dados, parece-me bastante evidente que a maioria dos “de menor” que cometem crimes vem de classes desprivilegiadas. É claro que a elite também tem seus abortos, mas não são assim tão numerosos; talvez, por isso, choquem mais do que a proliferação do crime em classes “menos nobres”, o que me parece um contrassenso, já que devíamos estar nos preocupando mais com o macroproblema do que com o micro.
Ao diminuir a maioridade penal, os meninos (em sua maioria) e as meninas, de 16 anos, irão para as prisões já lotadas para conviver com adultos experientes e, muitas vezes, cruéis. Mas os meninos e meninas de 14, 12, 10 anos continuarão cometendo seus roubos e assassinatos e assumindo a culpa em lugar de adultos que querem se safar da prisão. Grande mudança que, se aprovada, só servirá para agradar à massa boçal que quer ter a ilusão momentânea da solução de uma situação histórica.
Temos leis e boas leis, o problema é que ou não são cumpridas ou são ineficazes diante de uma situação que exige mais do que punição, que exige uma reestruturação social. Afinal, nossa Educação pública está falida e governos mal-intencionados (neste ponto, vemos os monstros que colocamos no poder) ainda veiculam propagandas enganosas para convencer o povo alienado de que em nossas escolas tudo está bem.
E quem é que duvida que a Educação, além da Arte é claro, é a solução para grande parte de nossos problemas? Para duvidar, é preciso pensar, e como nossa educação é uma ficção, um engana-trouxas, é compreensível que, para algumas pessoas, pareça mesmo difícil lidar com ou questionar essa verdade óbvia (pelo menos para aqueles que pensam).
Chegamos ao cúmulo de encontrar alguns professores, com quem infelizmente esbarro por aí, que acham que Filosofia e Literatura são inutilidades na escola, que as ciências exatas e biológicas são mais importantes e que a escola não é feita para educar (entendamos educação como formação humana e crítica), mas para formar força de trabalho.
Ai, que cansaço!
Podemos diminuir a maioridade penal e ignorar que as instituições corretivas para menores infratores são grandes depósitos de tortura, desumanidade e ódio, e que os presídios são matadouros oficializados (matadouros não só de corpos, mas principalmente de almas). Continuemos com o discurso de que bandido merece morrer, de que pena de morte é a solução, e esqueçamos que não temos educação neste país (a não ser que possamos pagá-la) e que aqueles que podem pagar por ela ainda são vítimas de profissionais alienados que veem a educação como funcionalidade e não atividade pensativa e criadora. Acreditemos que as universidades públicas estão mais igualitárias, que todos agora têm direito à educação superior de qualidade, enfiemos o pé na merda das crenças e ilusões. Acreditemos que pensar é chato, é tedioso, que dá sono. Cultivemos a ideia linda de que é preciso estimular os alunos com um dinamismo boçal showman e inócuo. E esqueçamos que o que realmente transforma um ser humano, além da própria vivência, é a leitura, é a reflexão, é o pensamento.
Enquanto este país não se debruçar sobre os livros, não se inebriar no pensamento filosófico, continuaremos na merda cada vez mais fedida em que nos encontramos. Enquanto jogadores de futebol forem mais reverenciados do que pensadores, podem ter certeza, este país nunca será coisa nenhuma, viveremos em um nada absoluto, em que a boçalidade reinará suprema.
Meus pêsames, Brasil!
Warley Matias de Souza.
Texto originalmente publicado em http://cronicasdobrasil.blogspot.com.br/2013/04/mais-pensadores-e-menos-jogadores-de.html
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